domingo, 10 de abril de 2016

O mundo precisa de adultos





Já publicamos um post falando que o adulto sumiu. Era um texto com muita ironia. Chegou a hora de falar mais sério sobre esse sumiço.
Adulto virou adjetivo. Quando se diz que o filme ou a revista tem temática adulta, significa que aí vem sacanagem. A isso chegamos. No melhor dos casos, o adulto é um cara sisudo que não tem a alegria dos jovens. Adulto virou sinônimo de cara feia.
Vamos tentar reverter esta situação. Ser adulto vale para homens e mulheres. É viver a maturidade própria da sua idade, ou seja, não como as crianças, os jovens ou os idosos. É o adulto que gera, cria e tenta educar as crianças e os jovens, é ele que assiste os idosos, ao mesmo tempo em que procura ouvir e aprender deles. Por tudo isso, tem um papel importante na condução do mundo.
O problema é que ele sumiu. Nos nossos tempos, a pessoa só deixa de ser jovem quando se torna “gagá”. Um homem com 60 anos sai por aí dizendo que arrumou uma namorada e só fala de carros e restaurantes. Uma mulher de 50 anos continua tendo como principal tema de conversa festas e frivolidades.
Ser adulto é ser responsável? Penso que todos devem ser responsáveis, cada um a seu modo e tempo. A criança pode e deve ser responsável na escola. Ser adulto é saber ponderar, ter em conta os matizes da realidade? Certamente, mas isso se aplica também a jovens e idosos. Ser adulto é ser independente? Todos precisamos saber se virar e saber pedir ajuda, de acordo com as circunstâncias de cada um. Talvez uma coisa seja própria do adulto: ter dependentes sob sua guarda. Seja na família, no trabalho, numa instituição ou na sociedade. E todos esperam dele que seja fiel e faça a sua parte.
Porque é difícil ser adulto em nossos dias?
Veneração pela juventude.
No passado, o jovem era alguém que tinha que ser ensinado pelos mais velhos. Com a invenção da adolescência feita pelo mercado de consumo e um par de intelectuais (vide post A criação da juventude), o jovem passou a ensinar os adultos como se vive. A partir dos anos 60 a situação se agravou e os jovens disseram aos adultos: Não há mais esperança para vocês. A melhor opção, se ainda querem ser felizes, é renunciar a crescer, usem nossas roupas e cabelos, transgridam e tentem nos imitar o melhor que puderem. Solução Peter Pan.
A geração do Vale do Silício trouxe mais pimenta ao dizer ao mundo que só os jovens são criativos. Mark Zuckerberg, inventor do Facebook não teve receio de afirmar: “Os jovens são mais inteligentes”. Se isso é verdade, a crosta de ignorância impede o uso da mesma. Nossa cultura está totalmente convencida de que o jovem é a encarnação da autenticidade e da irreverência (e de que isso são valores) e que deve ser venerado como a esperança da humanidade.
Modelos de educação e vida

Antigamente a maior parte da população mundial vivia no campo. As crianças e os jovens tinham um papel a desempenhar. Produziam, segunda sua capacidade. Pegar água no poço, pastorear os animais, ajudar na colheita, cuidar dos irmãos mais novos, etc. A ida à escola não impedia que trabalhassem e ajudassem seus pais. Mesmo nas cidades, era comum ver naqueles anos jovens vendendo jornais nas esquinas, fazendo serviço de entrega, atendendo no balcão da loja, etc.
Cresciam em um ambiente de responsabilidade, porque o que estava em jogo era a sobrevivência da família. Ao chegar na casa dos 20 anos, esses homens e mulheres casavam, saíam da casa dos pais e tratavam de trabalhar para sustentar sua nova família.
Compare com a situação atual. A criança e o jovem se tornaram meros consumidores. Possuidores de muitos direitos e poucos deveres. Não sabem pagar uma conta no banco, pegar ônibus ou limpar a cozinha. Tudo o que se exige é que estudem. Feito isso, estão liberados para curtir a vida, tendo seus pais como lacaios que os servem, sustentam e atendem a seus gostos. Para piorar a situação, o nível dos colégios e universidades exige uma hora de estudo por semana para conseguir boas notas. E por apenas 9 meses do ano. E essa criatura jovem, quase inútil, ainda é vista e incensada pelos mais velhos, como pináculo da humanidade.  Como podemos esperar que aos vinte e poucos anos, sem ter tido responsabilidades, sem ter enfrentados desafios, de repente ponha os pés no chão e se comporte como um adulto?
Em um post anterior escrevemos que antes dos 30 anos o cérebro ainda não “cristalizou”. Nesses anos é muito mais fácil adquirir hábitos novos. O treino para fazer as tarefas próprias de um adulto torna-se difícil após esse período. Pedir a uma mulher ou a um homem que “tome jeito” ou “aguente o tranco” aos 35 é muito diferente do que pedir isso aos 25 anos. O que era para ser feito de forma gradual, no seu tempo, passa a ser exigido de uma tacada e tarde demais.


 Escolhas e opções
 Voltemos ao Brasil do século XIX. O que você poderia comprar com vinte anos, trinta anos de idade? Que lugares do mundo poderia conhecer? Que profissões poderia exercer? Compare com os nossos dias e veja a abundância de escolhas disponíveis, em todos os campos da vida!
Mas, tudo tem seu preço. Escolher significa renunciar a outras opções. Mas o homem e a mulher modernos, disseram: Não! Quero tudo! Não quero renúncia! Não quero fechar portas! Quero casar, viajar, trabalhar, cobrar escanteio e cabecear.  Acontece que a realidade não permite isso e alguma coisa vai dançar: vem o divórcio, a carreira trunca, a noitada prejudica a saúde, etc. Por outro lado, quem tenta não decidir, fica em um limbo que não permite nenhum progresso real na vida.  Ora, é próprio da vida adulta escolher. Tomar decisões, assumir riscos, fechar portas. Há pessoas que dependem do adulto e este não pode ficar brincando de bem-me-quer, mal-me-quer.

 Jovem: o sucesso te espera
 No passado uma família tinha vários filhos e, destes, vários morriam na infância. A perda de um filho era um fato doloroso, mas corrente na vida. Com a redução da família para um, ou no máximo, dois filhos e baixa mortalidade infantil, cada pimpolho se tornou objeto de todas as atenções materiais (o que não significa que os pais estejam presentes). O escolhido passa a ser preparado desde o berço para ser “o cara”. Com talentos incríveis (só os professores é que não enxergam), o menino ou a menina entendem que o mundo deve se colocar de joelhos para eles. Como diz a socióloga Viviana Zelizer, os jovens passaram a não ter valor econômico (só consomem, não produzem), mas se tornaram emocionalmente impagáveis.
Passam os anos e vem o contato com o mundo real. Contato que tem sido cada vez mais tarde, somente após concluir a universidade. O processo de transformação de alguém que pensa ser especial em alguém que percebe que é um pedestre como outro qualquer é duro. E longo. A entrada no mundo adulto exige isso.


O caldo cultural não ajuda
Não se vê no horizonte mudança de perspectiva. Tudo que ouvimos são odes e louvores à juventude, ao romance e a curtir a vida. Não há propaganda que mostre uma pessoa trabalhando, pegando a vida, como o touro, à unha. Que novela ou série fala de pais responsáveis ou de gente séria? Tudo o que nos dizem é “pegue leve”; “no stress”; “keep calm and carry on”. De onde sairá o adulto? De onde menos se espera é que não vem nada mesmo.
Mas o mundo precisa de adultos. Porque precisa de profissionais competentes e experimentados (após muitos anos de esforço e sacrifícios continuados);  de gente que saiba dizer não quando necessário e mantenham e sustentem princípios e valores; de estabilidade e segurança, porque não se pode levar o mundo só no impulso e na criatividade; de gente que não queira apenas comer, mas também faça o pão; de pessoas que pensem menos em privilégios, concessões e indulgências e carreguem no ombro responsabilidades,  deveres e serviço; de pessoas que não pensem apenas no interesse próprio, mas no interesse dos demais e, sobretudo, dos que dependem deles.
Vamos trabalhar para que o mundo não se torne uma idiocracia: um mundo de tolos.

Artigo do blog: O Correio Chegou.

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3 comentários:

  1. Bom dia, Marcos! Estes textos do blog O Correio Chegou são muito bons. Mas é você que escreve?

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  2. Oi Amanda, não. O autor é o Maurício Perez, ele é professor de administração no IBMEC RJ.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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